segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Posídon e Anfitrite


Triunfo de Anfitrite – pintura sobre tela – Joseph-Marie Vien 1716 -1809




Crono, o senhor do tempo, decidiu que seu reinado como governante do Universo seria eterno. Adivinhando que Geia, sua mãe, que o odiava por ter humilhado Urano, não concordaria com sua resolução, resolveu agir sozinho. Ele sabia que Geia não acreditava no poder supremo de um único governante. Ela acreditava na mudança de épocas, no eterno movimento da vida; pensava que os jovens precisavam assumir o lugar de seus pais para renovar o mundo. Certamente, Crono teria que ceder seu trono a um filho seu.Geia, outrora, havia afirmado a Crono que um de seus filhos o destronaria e tomaria seu lugar. Até mesmo o todo-poderoso Crono começava a ficar amedrontado. Ele já não tinha mais tanta certeza que seu reinado duraria para sempre, pois, horrorizado, lembrava-se da maldição do pai e temia que os próprios filhos se voltassem contra ele, conforme ele próprio havia feito contra Urano, e teria que tomar uma horrível decisão: engolir os filhos que de Réia tivesse.Engoliu inteiro a Héstia, a primeira recém-nascida, enquanto a mãe, horrorizada, sofria em prantos.

E o mesmo destino teve Deméter, e Réia foi obrigada a entregar-lhe cada criança que dela nascia. Ao nascer o terceiro filho, a desventurada Réia, com a ajuda de sua mãe, Geia, conseguiu salvar Zeus, substituindo-o por uma pedra, o Abadir, enrolada em panos, que o titã voraz não teve sequer o trabalho de desenrolar tamanha sua gula. Foi a senha para Geia conseguir salvar mais três de seus filhos: Héra foi ocultada no oceano, Hades foi substituído por uma deusa chamada Glauca, que nasceu em seguida e não pode ser poupada, e Posídon foi salvo, transformado em potro e levado a uma cocheira na terra dos Pelasgos, depois foi entregue aos cuidados dos TésquinesEnquanto alguns se viam aprisionados vivos no divino e amplo estômago de Crono, os deuses salvos cresciam e viviam em terras distantes. Posídon havia sido criado pelos Télquines e pela oceânide Cáfire, na ilha de Telquínia, que no futuro levaria o nome de Rodes. Ainda adolescente, uniu-se com Hália, uma ninfa, que era filha de Póntos, a Onda Marinha, e de Geia, a Terra, e, além dos Télquines, eram também seus irmãos os antiqüíssimos Nereus, Fórcis, Taumas, Cefeus, Euríbia e o monstro-marinho Cétos.

Com ela, teve seis filhos e uma filha, Rodes.Então, um dia, incitado por Geia, a Terra, Zeus resolveu libertar suas irmãs aprisionadas no bojo do pai Crono. Fazendo-o vomitar através de uma poção mágica preparada por Métis, o raivoso Crono partiu para cima de Zeus, quando surgiram ao seu lado seus irmãos Posídon e Hades, que instantaneamente se posicionaram para protegê-lo. Crono, então, invocou o auxílio de seus poderosos irmãos Hiperíon, Jápetos, Céos e Crios, que prontamente surgiram ao seu lado. Não podendo enfrentar os Titãs de mãos vazias, já que os Titãs eram demasiadamente poderosos, Zeus e seus irmãos retiraram-se às pressas para reunir forças. Zeus contou com o auxílio de seus irmãos e demais deuses. Não estiveram sozinhos na batalha que iriam travar. Aliaram-se a eles o poderoso filhos de Océanos, que lutavam pela ordem, pelo trabalho e pela paz, respectivamente a poderosa oceânide Estige e seus filhos Cratos, Zelos, Bia e Niqué, que foram os primeiros a prestarem auxílio a Zeus. Outro forte aliado foi um deus que gostava muito da raça humana: Prometeus, filho do titã Jápetos, que resolveu ir contra o seu próprio pai em prol da humanidade. Aconselhados por Métis, Zeus e os demais deuses escolheram como campo um lugar do monte Olimpo, e profetizou que ali haveriam os deuses de construir a sua sede, um palácio magnífico e o seu santuário.

Com a derrota dos Titãs, Zeus encerrou-os no lugar mais profundo dos Infernos, deu punição aos seus inimigos e resolveu unir-se a algumas Titânidas e com elas ter filhos: com Mnemósine teve as Musas, para cantarem a sua vitória, com Métis teve Atena, que nasceu tardiamente pela cabeça de Zeus, com Têmis teve Astréia, as Horas, as Moiras, Homónoia e as Ninfas do Erídanos. Só então Zeus casou-se com Héra, sua irmã. Em seguida, realizou a partilha do mundo, concedendo a Hades os subterrâneos e os Infernos e a Posídon todas as águas que circundam e adentram-na na Terra.A Posídon, que lhe coube pela sorte o domínio dos mares, Zeus deu-lhe de presente uma grande carruagem com a forma de concha. O carro vinha atrelado a dois seres monstruosos, metade cavalo metade serpente.— Posídon, leal herói, a ti, com teu tridente, entrego todo o governo das águas que encontrares, estejam elas nos rios, nos lagos ou mesmo nos mares. Também cabe a ti mandar na fauna e na flora que pelas águas habitam!— Levarei Deméter comigo, meu irmão! É com ela a quem vou me casar!Posídon, todo agitado, pleno de orgulho e glória, assim gritou, enquanto Deméter só ouvia, quieta em um trono, que não conseguia esconder todo o desgosto que saltava de seus olhos, em seu rosto.

Reconhecia o valor de Posídon, pois lutara ao seu lado, contudo, não tinha intenção de unir-se em matrimônio sincero, com qualquer imortal. Amava os seres humanos com muita intensidade, estranho sentimento conhecido por todos os presentes. Forte constrangimento invadiu a reunião. Brilhava o ouro do salão, refletindo em cada borda, torneado de colunas, no teto e no chão dourados, a tensão inquietante, diante daquele impasse causado pelo desejo do temido rei dos mares. Todos sabiam que Posídon, quando expressava algum pedido, falava mais em tom de mando, certo de que seu gosto haveria de ser realizado. Assim, aguardaram de Zeus mais justa e sábia palavra que trouxesse paz à partilha dos poderes, visto que temiam ver ferido o coração de Deméter. Zeus permanecia calado. E Posídon, já em seu carro, pronto para partir, ansioso para governar o seu reino, estendeu o braço na direção de Deméter, crendo que o silêncio de seu irmão lhe era o consentimento para levar a irmã.Dura, Héra encarou Zeus, feito quem exigia dele mais correta intervenção.

Assim fez Hades, e Héstia adiantou-se do trono em que estava sentada.— Meu senhor, não pode ser o que vai acontecer!— Cala-te! Não te intrometas, com a moléstia da pressa, cara Héstia, pois percebo a aflição que se passa! Seria justo o que pretende nosso irmão Posídon, se eu, a meu mando, não tivesse comigo, também, a missão de doar Deméter!Então, Zeus se dirigiu a Posídon:— Não queiras além do que quero, valente Posídon!Posídon, muito abatido por tal decisão, conteve-se e teve que aceitar. Sequer respondeu à ordem recebida. Levando em mãos o tridente, arma que usara desde as primeiras batalhas contra os Titãs, fez avançar seu carro para fora do salão real, rumo ao Oceano. Por onde passava, tremia a Terra, e gritava o Ar.Posídon, apesar de morar agora nas profundezas dos mares, tinha o poder de saber tudo o que se passava no mundo. Seu tridente lhe dava o poder de acalmar os elementos, desencadear maremotos e fazer surgir ou desaparecer as ilhas. Devido ao temor que seu poder provocava, todos tinham medo dele e nenhuma mulher queria se envolver com ele.Posídon era um deus rabujento e colérico, sempre fincando seu tridente no fundo do mar e provocando terremotos a propósito de qualquer contrariedade, a ponto de ser conhecido pelo nome de Enosigeus, “o Abalador da Terra”.

E Zeus entendia e sabia dos motivos de ser tão brutal.— “Posídon, o importuno”, eis o que é! É, não tem jeito mesmo, vamos ter de lhe arrumar uma esposa... Quem das deusas do Olimpo?Zeus pensou... pensou... e chegou a uma conclusão: haviam muitas Ninfas espalhadas pelo mar, como as Oceânides, as Nereidas e as Tritônidas. Posídon deveria escolher uma delas.— Íris!— Sim, meu pai. — Vai até o fundo do mar e traz a mim o velho Nereus.Océanos, unindo-se à sua irmã Tétis, havia tido, entre tantas Oceânides, uma filha chamada Dóris, que se casou com Nereus, filho do deus Póntos. Tiveram cinqüenta belas filhas, as Nereidas. E chamavam-se: Actéia, “a que mora nas costas”, Agave, “a nobre”, Anfitrite, Autónoe, “a que inspira”, Cálice, Cimatóloge, “a que apara as ondas”, Cimo, “a deusa da onda”, Cimódoce, “a que recolhe as ondas” ou “o marulho”, Cimótoe, Clímene, Dinâmene, “o movimento dos vagalhões”, Díone, “a deusa”, Dóris, “a dos dons”, Drimo, Érato, “a que desperta o dom do amor”, Espeio, “a que mora em cavernas”, Eucrantis, “a que traz a realização”, Eudora, “a dos bons presentes”, Eulimene, “a dom porto favorável”, Eunice, “a vitória feliz”, Eupompe, “a da boa escolta”, Evarne, Ferusa, “a que traz”, Filódoce, Galatéia, “branca como o leite”, Galena, “o tempo calmo”, Glauce, “o verde-mar”, Glaucônome, Hália, “a que mora no mar”, Hipónoe, “selvagem com a égua”, Hipótoe, “ligeira como a égua”, Ione, “a deusa da praia”, Laomedéia, “soberana do povo”, Liágore ou Evágore, “a eloqüente”, Lisianassa, “a senhora redentora”, Menipe, “a égua corajosa”, Neséia, “a que mora nas ilhas”, Neso, “a deusa da ilha”, Orítia, Pânope ou Panopéia, Pasitéia, Plóte, “a nadadora”, Polínoe, Pontoperéia, “a que viaja pelo mar”, Prónoe, “a próvida”, Protomedéia, “a primeira soberana”, Psâmate, “a deusa da areia”, Tália, “a verde”, Temiste, Tétis e Toe, “a que se move depressa”. Houve outra nereida, Doto, “a doadora”, nascida de Nereus e sua filha Galatéia.

Então, Íris, que era muito veloz, pois era alada, rumou para o mar. Recolhendo suas asas, deu um mergulho espetacular e chegou até os domínios do deus Nereus.E, mais tarde, no Olimpo...— Nereus, meu velho, que bom ver-te aqui no Olimpo outra vez! Como tens passado?Nereus, de longas e alvas barbas, suspeitava que Zeus tramava algo, e perguntou:— O que ordenas, deus supremo?Zeus pôs uma mão sobre o ombro do velho amigo e disse:— Pois bem. Quero que cedas uma de tuas filhas a meu irascível irmão. Não posso mais suportar as suas teimosias e temo que haja um confronto mais sério entre nós, caso ele não se acalme. Tu sabes, precisa de alguém que lhe aconselhe, lhe acalme, lhe dê conforto... essas coisas.— Sei. Pois não, poderoso Zeus. Podes escolher qualquer uma de minhas cinqüenta filhas.— Cinqüenta? Não eram cem?— É... podem ser cem, como podem ser mil... não importa. Seja como for, são muitas.Depois de estudar a questão, uma multidão de Nereidas foi chamada a comparecer no Olimpo, e Zeus viu-as umas mais belas que as outras. Eram todas belíssimas. Mas Zeus, depois de observar uma por uma, notou que uma delas se escondia atrás das demais, e procurava esconder-se à medida que Zeus tentava observá-la. E Zeus perguntou:— Como se chama aquela que não se deixa mostrar?— Perdoa-me, senhor, mas são muitas. Qual?— Aquela, a menos assanhada... que está bem atrás das demais. Como se chama?— Ah, é Anfitrite. Ela é um pouco tímida, sabe... Mas não te preocupes com ela, tem muitas outras que podem servir...E Zeus interrompeu-o, jubiloso:— Anfitrite será a esposa de Posídon!— Mas será que não seria melhor...— Não, não, Anfitrite será a esposa ideal.Zeus deu uma palmadinha na face enrugada do amigo, que voltou-se para a filha e olhou-a com tristeza. Anfitrite amava seu pai com tanta ternura e compreensão que para ficar em sua companhia para sempre havia decidido jamais casar-se.

Nereus, para não contrariar a vontade do rei dos deuses, concluiu:— Está bem. Manda teu irmão ele mesmo ir buscá-la. E retirou-se.No mesmo dia Zeus comunicou a escolha ao mal-humorado irmão, que decidiu, ainda assim, conhecer a sua futura noiva.— Vai com calma. As filhas de Nereus costumam ter o senso de independência muito pronunciado.Porém Posídon, que tinha o senso de prepotência ainda mais pronunciado, não se intimidou.— Onde posso ir encontrá-la?— Ela está na ilha de Strongyle, junto com suas irmãs.Posídon, confiante, partiu de seu palácio azulado no fundo do mar em direção a Strongyle, a futura ilha de Náxos, conduzindo seu carro puxado por golfinhos.Fazia um lindo dia de sol quando chegou às margens pedregosas da ilha. De fato, por cima dos grandes rochedos franjados pelas espumas do mar, lá estavam as encantadoras filhas de Nereus, algumas deitadas, descansando, enquanto outras, mais animadas, executavam os passos de uma movimentada dança. De vez em quando uma delas, estirando a longa cauda recoberta de escamas douradas, dava um mergulho repentino nas águas verdes do arquipélago: um grande borrifo verde erguia-se, então, como se elas lanças sem lá do fundo um imenso punhado de esmeraldas, que subiam, faiscando, em todas as direções.

Posídon, o senhor dos mares, boquiaberto, pasmava para aquela cena paradisíaca. E exclamou o excitado deus, tratando, em seguida, de sentar-se ligeiro em seu carro.— Verdadeiramente encantadoras...De repente, ouviu a voz de uma das Nereidas.— Hei, Anfitrite! Vem juntar-se a nós!Os olhos de Posídon voltaram-se para uma grande pedra isolada, que estava situada mais para dentro do mar. A pedra tinha o formato de um leito, magnífico trabalho de polimento operado pelas perfeccionistas Ondas, que durante séculos, com toda a calma, a haviam polido até dar-lhe aquela conformação ideal.Em cima daquele leito solitário e da cor do chumbo estava estendida a divina Anfitrite. Era uma das poucas Nereidas a ter os cabelos negros, da cor da Noite, enquanto que as escamas de sua longa cauda tinham uma brilhante cor prateada, matizada por maravilhosos reflexos azulados e cor-de-rosa que se alternavam ao menor movimento. Com as costas coladas à pedra, Anfitrite dos cabelos negros tinha a face voltada para o alto; seu braço direito, caído sobre o rosto, protegia seus olhos dos raios fortes do Sol, enquanto os peitos firmes apontavam para o céu.Posídon pensou:— “Que mulher! Se tais são seus lábios e seu nariz... como deverão ser seus divinos olhos!”Um arfar mais indiscreto do deus, contudo, despertou a atenção da formosa Anfitrite. Seu braço caiu e as pestanas de longos cílios recurvos ergueram-se, piscantes — e foi, então, como se duas estrelas houvessem se descortinado.— Divina e encantadora Anfitrite! A partir de hoje tu serás minhas esposa e a ti caberá a honra de ser, para sempre, o repositório sagrado de meu divino sêmen.Anfitrite, assustada ao ver ao seu lado o deus verde do mar, de longos cabelos recobertos de mariscos e uma barba hirsuta tostada pelo Sol, deu um ágil mergulho para dentro da água.

Posídon ainda conseguiu agarrar um pedaço de sua cauda, mas as escamas lisas escorregaram por entre seus dedos, até surgir a grande e quase transparente barbatana, leve e fremente como um leque, que lhe deu uma bofetada, antes de desaparecer nas ondas.— Para onde foi...?E Posídon perdeu-a de vista. Percorreu todos os lugares próximos dali, foi procurá-la inúmeras vezes no palácio de Nereus, nas profundezas do mar, mas ninguém sabia dizer onde ela estava. Anfitrite havia sumido e foi esconder-se nos confins da Terra, perto de onde o titã Átlas sustentava o firmamento sobre os ombros.Irado, Posídon começou a sapatear e a bater ferozmente com seu tridente por toda parte, demolindo os imensos rochedos subterrâneos e provocando, com isso, terríveis maremotos na superfície dos oceanos. Ondas imensas eram cuspidas para o alto e montanhas inteiras arremessadas para as costas das aldeias litorâneas, levando o pânico a todos os mortais.Finalmente, Zeus, no último limite da aflição, ordenou a Nereus que revelasse o local onde Anfitrite fora se ocultar. O pobre velho não sabia, mas sua esposa Dóris, como toda boa mãe, sabia.Depois de um sem-número de pedidos, Zeus finalmente conseguiu obter da mãe das Nereidas o que as súplicas do velho marido não tinham podido alcançar. Disse-lhe Zeus:— Somente as carícias de tua divina filha poderão suavizar o rude temperamento de meu irmão.

E quando isto acontecer, e a crosta primitiva de meu irmão houver caído, verá ela que se casou com um homem gentil e atencioso, além de ter se tornado rainha de todo um império.E resmungou a mãe de Anfitrite:— Rainha de todo um império...Anfitrite havia-se também recusado casar-se com Posídon, porque temia ser forçada a viver longe de seus pais e de suas irmãs. Entendendo seu ponto de vista, que era muito justo, ainda assim teve que ceder, embora deixasse bem claro que não fazia questão alguma que sua filha se tornasse uma rainha.Dóris revelou o lugar do esconderijo de sua filha. Desesperado, Posídon, com medo de assustar novamente sua futura esposa, pediu ajuda a seus súditos, os animais marinhos, a fim de localizá-la e prepará-la. Atendendo ao apelo do seu senhor, incentivados por Zeus, dois golfinhos localizaram Anfitrite e conseguiram convencê-la a ouvir o que o deus pretendia dizer-lhe. E Anfitrite, percebendo que não havia saída, aceitou. E os golfinhos retornaram para buscar Posídon, que rumou para lá, silenciosamente, montado em um discreto golfinho.Dentro de uma caverna, oculta por uma floresta de líquens, estava a assustada nereida, quando Posídon, pé ante pé, adentrou o recinto, desta vez com suas barbas lustrosas e perfumadas.— Anfitrite adorada! Vem comigo, e garanto que não terás jamais motivos para te queixares de mim.Posídon parecia realmente mudado: trajado modestamente, sem aquele ar arrogante que o caracterizava, havia deixado em casa até o seu horroroso tridente. Anfitrite, cautelosa, estudou ainda, longamente, o aspecto do deus. Depois, ainda indecisa sobre se deveria ou não aceitar aquela proposta, perguntou, amuada:— E quanto àquele negócio de “meu repositório de sêmen”?Posídon baixou os olhos.— Oh, não, esquece esta bobagem! Tu serás, para sempre, apenas o repositório de minha divina devoção e meu divino afeto.Ainda mais corado por aquele sorriso de superioridade da ninfa,

Posídon enterrou as unhas nas palmas das mãos e resolveu voltar ao velho estilo:— Vem, vamos de uma vez, minha rainha!E encurralou-a na parede da gruta úmida e deu-lhe um beijo intenso e apaixonado.Depois levou-a nos braços até o golfinho, e retornaram para o palácio de Posídon, onde, então, foi preparada uma grandiosa festa de casamento. Desde então, passaram a governar felizes o imenso império dos mares.Tal acontecimento, fez Posídon esquecer-se de Deméter por algum tempo, e, em agradecimento, o deus intercedeu junto a seu irmão Zeus que imortalizou os dois golfinhos que o ajudaram nas Constelações. Anfitrite foi viver em um majestoso palácio de safira que havia no fundo do mar Arquipélago, não muito longe da costa onde ficava a cidade de Égas, no norte da Acaia, onde haviam-lhe erguido um santuário. Longe, acima das águas, as tempestades varriam as superfícies dos mares, mas nas profundezas a paz era eterna. Grupos de Ninfas ficavam à disposição de Anfitrite para realizar-lhe todos os desejos.Em um carro puxado por quatro corcéis imortais, a deusa sempre que quisesse passeava sobre as ondas ao lado do marido. E quando o casal passava, as ondas se abriam, as aves marítimas voejavam acima de suas cabeças e os golfinhos brincavam alegres nas águas azuis.Em seus passeios, Posídon e Anfitrite eram quase sempre acompanhados por um grupo de deuses marinhos. Entre eles estavam Nereus e as Nereidas.

Nereus era o grande adivinho dos oceanos, aquele que nunca mentia e só dizia a absoluta verdade aos homens. Entre eles, também, acompanhava-os o fruto de sua união: Tríton, e dezenas de Ninfas suas filhas. Tríton soprava sua concha, cujo barulho ensurdecedor provocava grandes tempestades. O velho Proteus também passeava com eles. Proteus não gostava que as pessoas soubessem de seus dotes de vidente e fugia dos curiosos.Além de Proteus, Posídon e Anfitrite tiveram ainda duas filhas, Rode e Bentesícime. Porém, Anfitrite recebeu de seu marido tantos motivos de ciúme quanto Zeus dera à rainha Héra, com seus casos amorosos com deusas, Ninfas e mortais.Quanto aos golfinhos que auxiliaram Posídon a conquistar Anfitrite, Zeus, muito grato, homenageou-os fazendo surgir nos Céus uma constelação: a do Delfim

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